Segundo Raquel Dias, 1ª vice-presidenta do ANDES-SN e integrante da coordenação do Grupo de Trabalho de Política Educacional da entidade, o programa Mais Professores, lançado recentemente pelo Governo Federal, não promove a valorização dos docentes, sendo apenas uma tentativa de mascarar a realidade da Educação brasileira. Para a professora, “o programa Mais Professores é muito limitado e não tem relação com aquilo que poderíamos chamar de valorização da docência. E nem com o que ele se propõe”.

O programa é estruturado em cinco eixos: seleção para o ingresso na docência, atratividade para as licenciaturas, alocação de professores, formação docente e valorização. No entanto, Raquel afirma que nenhum desses eixos promove mudanças estruturais significativas que garantam a real valorização da carreira docente, como a melhoria de salários, condições de ensino e aprendizagem, planos de carreira ou infraestrutura escolar.

Seleção

Um dos pontos centrais do programa é a criação da Prova Nacional Docente (PND), a ser realizada anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Estados e municípios poderão adotar a PND como parte de seus processos seletivos para contratação de professores, e os interessados deverão se inscrever diretamente no Inep.

Raquel Dias destaca que essa proposta não é nova, tendo sido apresentada em 2011 durante o segundo governo Lula, por meio de um decreto que previa a implementação da Prova Nacional de Concurso para o Ingresso na Carreira Docente. Contudo, o projeto não foi levado adiante.

A docente critica a PND por adotar uma lógica de padronização dos exames de larga escala, alinhada à Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e à BNC-Formação, que estabelece um currículo comum para a formação de professores. Segundo Raquel:
“Essa prova estabelece regras comuns para a contratação de professores, baseando-se em uma formação padronizada. Isso desconsidera as particularidades culturais e regionais de um país tão diverso como o Brasil. Embora seja importante haver elementos comuns no currículo, é fundamental respeitar as especificidades de cada região, estado e município.”

Atratividade

Para atrair novos docentes, o Ministério da Educação (MEC) instituiu o programa Pé-de-Meia Licenciaturas, que oferece uma bolsa mensal de R$ 1.050 durante o período regular do curso de licenciatura. Do total, o estudante pode sacar R$ 700 mensalmente, enquanto os outros R$ 350 serão depositados em uma poupança. Esse valor poderá ser retirado após o recém-formado ingressar em uma rede pública de ensino, em até cinco anos após a conclusão do curso.

As bolsas são direcionadas a estudantes que obtenham nota igual ou superior a 650 pontos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

Os estudantes que ingressarem em cursos de licenciatura por meio do Sisu, Prouni ou Fies Social poderão ser contemplados com o auxílio do programa Pé-de-Meia Licenciaturas, desde que tenham alcançado nota igual ou superior a 650 pontos no Enem.

Raquel Dias, diretora do ANDES-SN, destaca que o benefício está disponível tanto para estudantes de instituições públicas quanto privadas, o que amplia o repasse de recursos públicos à iniciativa privada, por meio dos programas de transferência de recursos federais, como o Fies e o Prouni. Além disso, ela aponta que a medida valoriza apenas o ingresso nos cursos de licenciatura, sem promover a valorização da profissão docente em si.
“Estudantes não querem fazer licenciatura porque o magistério é desvalorizado. Essa bolsa, assim como o restante do programa, não representa uma valorização da profissão. Não há qualquer iniciativa que melhore os salários, as condições de trabalho ou que promova a reestruturação dos planos de carreira. Os cinco eixos do programa ignoram pontos essenciais como o piso salarial nacional dos professores, a criação ou a revisão de planos de carreira, ou mesmo a melhoria da infraestrutura das escolas. O governo promove uma maquiagem, disfarçando como valorização aquilo que claramente não o é”, critica Raquel.

A coordenadora do GTPE também questiona o destino dos valores destinados aos estudantes que ficarão retidos durante o período de quatro anos – tempo médio de conclusão da licenciatura. “Esses R$ 350 ficarão guardados, mas não em uma caixa. Provavelmente serão especulados no mercado financeiro. É mais uma forma de direcionar recursos do fundo público para a especulação de capital”, aponta.

Alocação

O programa também inclui a criação da bolsa Mais Professores, que visa apoiar financeiramente a atuação de docentes nas redes públicas de educação básica e incentivar sua permanência em regiões com maior carência de profissionais. O participante receberá uma bolsa mensal de R$ 2.100, além do salário pago pela rede de ensino à qual estiver vinculado. Durante o período de vigência da bolsa, o professor deverá cursar uma pós-graduação lato sensu com foco em docência.

No entanto, Raquel ressalta que, assim como o Pé-de-Meia Licenciaturas, a bolsa Mais Professores não ataca os problemas estruturais da educação. “O programa não aborda questões cruciais como a falta de infraestrutura adequada, as condições de trabalho muitas vezes precárias, os salários baixos e as carreiras desestruturadas. Trata-se de mais um paliativo, sem qualquer compromisso real com a valorização da docência. Esses programas não resolvem a questão salarial, são apenas penduricalhos”, critica.

Formação

No eixo da formação, o Ministério da Educação (MEC) lançou uma plataforma centralizada com informações sobre cursos de formação inicial, continuada e pós-graduações oferecidos pelo próprio MEC e por instituições parceiras, incluindo privadas. O objetivo, segundo o governo, é fortalecer o desenvolvimento profissional dos docentes, alinhando as formações às suas áreas de atuação.

Contudo, Raquel Dias alerta que a criação de um portal de informações, por si só, não é suficiente para garantir que os professores tenham condições de participar desses cursos. Ela enfatiza que o programa não apresenta medidas estruturais, como licença remunerada para formação, redução da carga horária de trabalho, melhoria salarial ou políticas de carreira que reconheçam e incentivem a formação continuada.

Valorização

No eixo da valorização, a proposta do MEC limita-se a parcerias com o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, oferecendo benefícios como cartão de crédito sem anuidade. Além disso, em cooperação com o Ministério do Turismo, o governo planeja descontos de até 10% em diárias de hotéis, inclusive durante grandes eventos ou feriados.

Entretanto, o programa não apresenta medidas que efetivamente valorizem a profissão docente. Pelo contrário, as iniciativas propostas podem levar ao maior endividamento dos trabalhadores da educação, sem aumentar sua renda ou poder de consumo.
“Ter condições de consumo não significa apenas ter um cartão de crédito com benefícios, mas ter uma renda que permita arcar com o consumo. Como os professores poderão pagar as faturas do cartão de crédito se os salários continuam defasados? Ou mesmo aproveitar descontos em hotéis, se não têm condições financeiras básicas?”, questiona Raquel Dias.

A docente lamenta que, em vez de investir em políticas que realmente valorizem o papel social dos professores, o governo adote medidas que carecem de impacto significativo e, ainda, favorecem o mercado financeiro.
“A valorização da docência passa, obrigatoriamente, pela melhoria dos salários, respeitando principalmente o piso salarial. Esse piso não apenas garante uma remuneração digna, mas também prevê melhores condições de trabalho, incluindo carga horária adequada para planejamento pedagógico. Infelizmente, muitos governos municipais sequer cumprem a Lei do Piso, e o governo federal não apresenta qualquer sinalização de que pretende pressionar pelo cumprimento dessa legislação”, ressalta.

Outro aspecto essencial ignorado pelo programa, segundo a diretora do ANDES-SN, é a implementação de uma gestão democrática nas escolas. “Os professores enfrentam, diariamente, gestões autoritárias e vivem sob constante ameaça de assédio moral. A valorização e o reconhecimento social dos professores dependem de uma gestão escolar mais participativa e respeitosa. A própria sociedade precisa reconhecer os docentes como agentes fundamentais na produção e reprodução do conhecimento e como peças-chave na formação de todos os outros profissionais. Resgatar o valor social da docência é imprescindível, mas o programa do governo não apresenta qualquer proposta nesse sentido”, conclui Raquel.

Em nota divulgada na sexta-feira (17), o ANDES-SN reforçou:
“A valorização dos(as) professores(as) requer investimentos concretos na formação inicial e continuada, na carreira, nos salários e nas condições de trabalho. As ações do programa Mais Professores para o Brasil não abordam essas questões fundamentais nem configuram políticas permanentes que promovam a valorização do magistério. Portanto, não há motivos para comemorar medidas que são apenas paliativos para problemas de origem histórica.”

  1. Concordo plenamente, pois a primeira coisa que procurei saber se havia melhorias no plano de carreira do magistério e os salários dignos da profissão e realmente não conta nada disso.
    Precisamos ser valorizados politicamente, financeiramente e socialmente, hoje se fosse fazer uma faculdade, com certeza não faria na área da Educação e docência!!!

    • Com certeza! Nós precisamos é de uma valorização efetiva. Uma delas é na questão salarial. Sem dúvidas! Que nos paguem os atrasados e dêem os reajustes que está defasado chegando a 40%.
      Além disso, é necessário ter atenção em relação às horas atividades, profissionais especialistas para os estudantes atípicos, formação continuada, estrutura física.
      Uma verdadeira valorização ética, profissional e moral

    • Concordo em gênero, número e grau como se diz. Os alunos reconhecem melhor que os governantes as condições de trabalho dos professores. Por isso não são atraídos para a carreira docente. Para eles, assim como para nós não há enganos. Estamos todos os dias diante da realidade de ser professor no Brssil e essas medidas não serão a solução. Reconhecer é valorizar, garantir direitos e melhores condições de trabalho e respeito acima de tudo.

  2. Concordo plenamente.
    Precisamos de uma valorização no poder aquisitivo, condições de pagar nossos boletos, compra ( arroz e feijão, pelo menos) e também condições de pagar uma viagem. O que ocorre que atualmente viaja- se 2 dias em um hotel e fica 6 meses para pagar.
    Aqui estamos com quase 40% defasado nos reajustes e nada se fala.
    Além dessa valorização, há de se destacar a importância da valorização em formação continuada efetiva, profissionais para atender alunos atípicos, estrutura, materiais, bibliotecas, laboratórios ,mais salas de aula, hora atividade….
    Muitos dos estudantes que não querem ir para licenciatura veem nas suas salas de aula o verdadeiro descaso do governo com seus professores…

    • Mudar de profissão não é algo tão simples assim… anos de estudo não podem e nem devem ser jogados na lama. Eu entendo que meus colegas querem é lutar pela carreira estando dentro dela e eu acho isso muito digino, minha senhora.

  3. Concordo plenamente, enquanto o governo não olha para os professores, a educação do nosso país não vai pra frente, tem que valorizar os professores com melhores salários

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